A aceitação dos elogios

Mulher
22.set.2015

Considerar-se uma pessoa digna de  elogios não é algo muito frequente entre mulheres, já reparou? Algumas de nós refutam imediatamente qualquer elogio e passam na hora a depreciar o objeto elogiado. Verdade!! Quem nunca presenciou (ou protagonizou) uma cena assim: alguém chega e elogia alguma coisas que a pessoa está usando e a reação imediata desta é desqualificar o objeto.  “Nossa, que vestido bonito!” “Ih, é velho, comprei numa liquidação há cinco anos!”  De minha parte, nunca presenciei um homem reagindo assim… Por que será, entretanto, que isto acontece a tantas de nós, mulheres?

Não tenho a resposta, embora já tenha visto a cena inúmeras vezes. Também me indago o porquê. De pronto, podemos pensar que a pessoa não tem confiança em si o suficiente para usufruir do elogio. Sente-se ilegítima em seu papel, blefando, e pensa: estão elogiando outra pessoa, esta não sou eu! É claro que tudo se passa no inconsciente, pois a reação de rejeição ao elogio é imediata, não dá nem tempo de pensar conscientemente.  Outra possibilidade é julgar a pessoa que elogia como sendo falsa, elogiando só para ganhar a simpatia. É certo que isto acontece, às vezes. Ultimamente, ocorre até com frequência em certas lojas: mal a cliente entra e lá vem uma vendedora “elogiar” alguma coisa que ela está usando. É o chamado “quebra-gelo” das técnicas de marketing, para criar uma falsa proximidade com a cliente, ficarem “amigas” e acontecer a venda. Mas, por que julgar da mesma forma alguém que se aproxima e inesperadamente nos faz um elogio, numa situação social?

Ou será que a auto depreciação acontece porque a elogiada está se prevenindo de um ataque invejoso? Pode ser que tema tanto ser invejada, que já procura desviar o olhar do interlocutor, se desqualificando ou ao objeto. Poderia ainda acontecer a tal desqualificação por uma espécie de falsa modéstia exacerbada, um vestígio de outros tempos que, nos atuais dias de exaltação do eu, anda muito fora de moda. Poucas chances tem esta hipótese, portanto.

De qualquer forma, a incapacidade de acolher bem elogios é um indício de que processos de auto depreciação devem estar em franca atividade. Uma pena, pois nossa sociedade já é extremamente crítica e, com todas estas dificuldades, vamos acabar perdendo algumas boas oportunidades de nos regozijar com um elogio sincero. Assim como os verdadeiros pedidos de desculpas, elogios sinceros são percebidos como tal e nos despertam muito prazer.

Por outro lado, há quem viva na expectativa do elogio o tempo todo, e sinta a ausência dele como desaprovação. Em nosso mundo contemporâneo, cada vez precisamos mais dos outros para nos enxergar. Na sociedade da superexposição, deixou de ser importante o que somos/sentimos de verdade: importa o que estamos interessados em fazer os outros acreditarem que somos. Aqui, a ausência de elogios pode ser sentida  como uma vaia: o retorno esperado, mais que nunca, é a aprovação alheia. E, se ele não vem, o vazio e a incerteza do próprio valor voltam a se instalar.

É  por isso que uma estrutura mental mais desenvolvida e amadurecida (atenção: não depende da idade!) desfruta mais dos elogios: não duvida que é merecedora, nem fica toda prosa. Somente aproveita. E esta é uma das aquisições que se pode esperar ao longo da vida: alguém vai se conhecendo melhor e pode até se surpreender agradavelmente com os elogios que recebe, mas já não fica constrangida, supondo que não os merece. Isso se dá naquela altura da trajetória individual em que a pessoa já se deixa mais em paz, diminui a auto-exigência e sofre menos com seus erros e imperfeições.

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