Ao longo de nossa existência, todos cometemos inúmeros erros. Em nossa sociedade, contudo, tornou-se muito difícil admitir que erramos. Nas relações a dois, no trabalho, em família, ou com relação aos amigos, é uma raridade. Em público, então, nem se fala. Em geral, sentimo-nos terrivelmente humilhados quando temos de admitir nossos erros para outras pessoas. Por mais que digamos que é bom “aprender com os erros”, temos uma enorme dificuldade de falar sobre eles e de usá-los a nosso favor ou em benefício de quem nos cerca.
Quando falamos de nossos próprios erros ou ouvimos dos erros alheios, entretanto, descobrimos que isso tem um poder até libertador: experimentamos alívio e chegamos à conclusão que errar não significa, como alguns julgam secretamente, que somos pessoas “inviáveis”. Exagero? Não, é assim que muitos de nós se sentem mesmo, quando veem que erraram. Os menos exigentes podem “só” pensar que estão sempre blefando, enganando o mundo que os cerca. Fato é que não lidamos bem com nossos erros, e nos faria bem entender que, de vez em quando, todos damos um “mau passo”, sem que isso seja o fim do mundo ou nosso.
Aqui surge a questão: se reconhecer os próprios erros tem um preço interno tão elevado, o que dizer do próximo passo, que seria pedir desculpas? É mesmo verdade que, na sociedade narcisista em que vivemos, desculpar-se está se tornando um evento mais e mais raro?
Se você é daqueles seres “antiquados” que ainda costuma se desculpar no dia a dia, deve notar que, quando o faz, as pessoas retribuem muito bem. Desculpas por pequenas e corriqueiras coisas despertam de volta acolhimento e gentileza.
Em geral, sendo humilde e assumindo a responsabilidade pelo que houve, a pessoa atrai simpatia em seu pedido de desculpas, pois está deixando explícito que sabe que, no mínimo, aborreceu o outro. Com alguém que está sempre na defensiva, tentando se justificar, nunca admitindo simplesmente que errou, fica muito difícil se relacionar, por serem pessoas que não pensam do mesmo modo e valorizam coisas diferentes. Neste caso, alguém se recusa a aceitar que o que fez teria o potencial de magoar alguém e, provavelmente, seguirá dizendo, aqui e ali, vida afora: “você é que é muito sensível”. Só que, numa convivência, não é possível subestimar os sentimentos de alguém, já que as pessoas “funcionam” de maneira diferente mesmo.
Em relações a dois, sejam familiares, afetivas ou de amizades, é preciso ser cuidadoso, tentar sempre estar saindo de si para entender quando o outro se sente desconfortável com coisas que se diz ou se faz. Se houver uma boa base afetiva e vontade de preservar o relacionamento, ser mais atento vai ajudar, na próxima vez. E, quando uma real intenção de mudar está presente, o pedido de desculpas surge com mais facilidade e com certeza soará verdadeiro.
Enfim, por que será que andamos tão despreparados para pedir desculpas? Não é difícil responder: envolvidos em nossa própria redoma, passamos a ter cada vez menos ideia do que fizemos que possa ter magoado o outro. Não conseguimos nos colocar no lugar dele para entendê-lo em sua mágoa. Às vezes, não sabemos mesmo como fazê-lo, não temos essa habilidade. Mas isso é um tipo de incompetência rara. Na maior parte das vezes não temos interesse, mesmo. Cultivar relacionamentos dá trabalho e não andamos muito dispostos a colocar esforços nisso. “Dá preguiça”, costuma-se dizer, numa aparente ironia, mas que é isso mesmo. É mais fácil seguir a vida, arrumando uma versão qualquer que nos favoreça, e colocar nos outros a culpa pelo afastamento. A palavra do momento é “descomplicar” a vida, pois não é?